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Opinião Jurídica: A recuperação judicial no singular

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Temos observado diversos casos  em que várias empresas, utilizando a Lei de Recuperação Judicial - Lei nº  11.101, de 2005 - entram com um único pedido de recuperação judicial com o  fundamento de serem do mesmo grupo econômico.

Em uma decisão, o Tribunal de  Justiça de São Paulo (AI nº 569.351.4/6) não firmou posicionamento sobre o  tema, pois entendeu que o recurso interposto dizia respeito apenas à forma  do plano de recuperação - um ou dois planos de recuperação separados -,  que deveria ser decidido pela assembleia de credores. Não foi objeto do  recurso a ilegitimidade ativa da segunda empresa.

Recentemente temos visto  posicionamentos defendendo a possibilidade de duas empresas proporem a uma  única ação de recuperação judicial. Tal corrente sustenta que: (i) havendo  "um ponto comum de fato ou de direito" é permitido o litisconsórcio; (ii)  atender-se-ia aos princípios da celeridade, da economia processual e da  preservação da empresa; (iii) havendo ação concertada entre as empresas  está criado grupo econômico de fato que prescinde de sua criação por  regular registro comercial.

Do ponto de vista econômico,  vislumbramos prejuízos aos credores de uma das empresas envolvidas na  recuperação que seja sã e solvente e seja dragada para o processo de  recuperação, inclusive com a suspensão temporária da exigibilidade de seus  títulos, até que seja decidido se será concedida ou negada à recuperação  judicial. Prejuízos maiores advirão em ambos os casos, pois, se o plano  for aprovado, se aguardará muitos anos pelo pagamento. No caso de o plano  ser reprovado e a empresa sã ser declarada falida, adeus ao pagamento de  créditos comerciais.

Do ponto de vista legal, a  própria Lei de Recuperação Judicial, em todos os seus dispositivos, se  refere à sociedade empresária, ao devedor e ao plano de recuperação  judicial sempre no singular. Não há nesta lei ou em qualquer outra  dispositivo que autorize a consideração de grupos econômicos de fato,  situação distinta da que se apresenta em direito do trabalho e direito  tributário.

O Código de Processo Civil e o  Código Civil, que fundamenta o direito privado em geral, têm previsão  legal que permite a consideração de grupos econômicos a favor do credor em  casos de fraude ou simulação para alcançar patrimônio do devedor. Não é  claramente o caso em comento. Aceitar a "disregard doctrine" aqui seria  consideração de grupo econômico de fato em prejuízo dos credores,  premiando os devedores.

Não vemos tampouco identidade de  situação de fato que permita o litisconsórcio ativo do ponto de vista  processual, pois o fato que qualifica a pretensão à recuperação judicial é  a falta de liquidez da empresa que possui lastro patrimonial e volume de  negócios suficiente para superar tal situação.

No deferimento da recuperação  judicial, o fato será a existência de condições de superação da crise da  empresa, com a aquiescência dos credores em um plano de negócio e um alongamento do perfil de seu endividamento. No caso de decretação de  falência, ou os credores entenderam não existirem essas condições ou houve  o descumprimento do plano de recuperação judicial, em todos os casos de  uma única empresa.

Os fatos, ou melhor, feixes de  fatos que caracterizam a situação econômica da empresa, são de uma empresa  individualmente, não havendo como serem idênticos para empresas  diferentes, com situação de caixa, créditos, débitos, patrimônio, equipe e  diversos fatores únicos em cada pessoa jurídica. Entender que estar  insolvente não é uma condição decorrente de um conjunto de fatos únicos,  mas um fato em si, levaria ao entendimento absurdo de que todas as  empresas insolventes do Brasil poderiam compor o polo ativo de uma única  ação de recuperação judicial.

Vale mencionar que o direito  empresarial brasileiro prevê em um único caso a consideração de grupo  empresarial sem o requisito do benefício aos credores é o grupo econômico  de direito. Tal previsão, contida na Lei das Sociedades Anônimas, depende  de registro do grupo econômico no registro do comércio, com todas as  respectivas formalidades, única hipótese em que entendemos cabível o  pedido de recuperação judicial de diversas empresas consideradas em  conjunto.

Inexistindo esse grupo econômico  de direito, entendemos que o tratamento correto da matéria seria  considerar as quotas ou ações das demais empresas, sob controle da empresa  insolvente ou não, como ativos a serem abordados no plano de recuperação.  Outra possibilidade é a simples coincidência entre acionistas ou quotistas  situação em que na Recuperação Judicial serão listados como bens dos  sócios e apenas na falência poderão ser alcançadas nas situações em que a  benefício dos credores puder ser desconsiderada sua personalidade  jurídica.

Dessa forma, caso todas  necessitem e atendam os requisitos para tal, cada uma das empresas do  grupo econômico de fato proporia a ação de recuperação judicial  separadamente, sendo decididos separadamente os respectivos planos de  recuperação pelas assembléias de credores, que terão composições  distintas, no mínimo quanto ao peso relativo dos votos. Havendo  necessidade de concatenação dos planos de recuperação, vislumbramos tão  somente a possibilidade de suspensão das recuperações em cadeia por  prejudicialidade, nos termos do Código de Processo Civil.

 

Autor: Rodrigo Alberto Correia da  Silva

Fonte: Valor Econômico (16/11/2009)

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