O Superior Tribunal de Justiça (STJ) deve receber uma nova controvérsia relativa à nova Lei de Falências, a Lei nº 11.101, de 2005. O caso envolve um processo em que 15 bancos estrangeiros pedem na Justiça que a massa falida do Banco Santos restitua os valores recebidos pela instituição - do ex-banqueiro Edemar Cid Ferreira - decorrentes de contratos de câmbio de exportação. Segundo a decisão da Câmara Especial de Falências e Recuperações Judiciais do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), os bancos estrangeiros, 11 deles organizados em um sindicato, devem receber US$ 75 milhões, antes dos demais credores do Banco Santos.
As partes estudam se vão apresentar recurso especial contra a decisão para que o STJ defina de vez a questão. Com a decisão do TJSP, o caixa da massa falida do banco cai de R$ 584,9 milhões para cerca de R$ 456,9 milhões. Os contratos firmados entre bancos estrangeiros e o Banco Santos são os chamados "ACCs", de Adiantamento de Contrato de Câmbio. São contratos firmados com exportadores em uma época em que a política econômica nacional estimulava bancos estrangeiros a fornecerem linhas de crédito para os bancos nacionais para o financiamento de exportação.
Os bancos estrangeiros adiantaram cerca de US$ 150 milhões para o Banco Santos. A empresa exportava, recebia do importador e, depois, pagava o banco do Edemar Cid Ferreira. O Banco Santos, por sua vez, tinha que restituir o banco no exterior. O TJSP já havia determinado a devolução do capital adiantado pelos bancos estrangeiros para exportações realizadas e pagas. A Circular do Banco Central nº 2.632, de 1995, que regulamenta o câmbio de exportação, garantia isso. Mas outra metade da dívida ainda estava no limbo. Isso porque trata-se de linhas de crédito que foram abertas, mas não houve pagamento ou mesmo a exportação. Inconformados, os bancos estrangeiros recorreram ao Poder Judiciário.
Segundo o advogado Luiz Fernando Paiva, do escritório Pinheiro Neto Advogados, que representa bancos como o Wachovia Bank National Association, as instituições financeiras estrangeiras têm direito ao privilégio, em relação aos demais credores, com base na Lei de mercado de capitais, a Lei nº 4.728, de 1965, e na política nacional de estímulo à abertura de linhas de crédito externas para bancos brasileiros. Somando apenas os créditos dos bancos representados por Paiva, como o Sindicato Orix de instituições financeiras, a dívida principal alcança o valor de R$ 87,8 milhões. Apesar da queda de recursos no caixa, demais credores, como a Fundação de Previdência e Assistência Social Real Grandeza, maior credora da massa falida do Banco Santos, veem a decisão como positiva.
Isso porque os bancos estrangeiros haviam pedido também a restituição de juros e o pagamento em moeda nacional, de acordo com o câmbio na data da liquidação do banco, ou seja, maio de 2005. Na época, o dólar estava cotado em R$ 2,47, valor bem diferente dos R$ 1,71 de hoje. Por isso, para o advogado Luiz Eugênio Araújo Müller Filho, do escritório Lobo & Ibeas Advogados, que representa o Real Grandeza judicialmente, os efeitos da decisão são benéficos. Segundo ele, se fossem considerados os juros e o câmbio da época, o valor que sairia do caixa da massa falida do banco seria de aproximadamente US$ 109 milhões. O Real Grandeza e outros 103 credores representados pelo Lobo & Ibeas têm um crédito total de R$ 786,1 milhões com o Banco Santos. A massa falida do banco também não sabe se vai interpor recurso especial no STJ.
Segundo o administrador da massa, Vânio Aguiar, está em estudo se será tomada alguma medida relativa à decisão do TJSP. Mas ele reconhece que o valor a ser retirado do caixa seria muito maior, caso os desembargadores do tribunal tivessem aceitado o pedido de aplicação de juros por parte dos bancos estrangeiros. "O valor chegaria a ser 45% maior", contabiliza. Quanto aos juros, segundo Aguiar, os desembargadores decidiram que, ao contrário dos ACCs, devem continuar na fila dos créditos quirografários - que são os devidos a outros bancos - no processo de recuperação e falência.
Os créditos devidos aos trabalhadores são prioridade em processos desse tipo. No julgamento, o próprio desembargador Romeu Ricupero chegou a recomendar que seja impetrado um recurso no STJ porque a questão é controversa. Segundo o advogado especialista em recuperação e falências, Manoel Justino Bezerra Filho, o recurso não pode ser encaminhado pelo tribunal diretamente. "Uma das partes precisa provocar o Judiciário nesse sentido", explica. O Banco Santos tem 1.982 credores. Os credores quirografários têm direito a R$ 2,69 bilhões, o que equivale a 96% do total de créditos devidos pela massa falida do banco.
Autor: Laura Ignacio
Fonte: Valor Econômico (19/11/2009)