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Quarta Online - Risco Sacado

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PARTICIPANTES: RAFAEL PIMENTA (Moderador e sócio de Galdino & Coelho - Pimenta, Takemi, Ayoub Advogados); RENATO BORANGA (Debatedor e Managing Director, FTI Capital Advisors); e, LUCIANA DIAS (Debatedora e sócia de LDias Advogados).

PALAVRAS-CHAVE: Risco sacado –  CVM – operação financeira - IFRS

SUMÁRIO: 1. Introdução – 2. O Risco Sacado e a interlocução com o “Caso Americanas”– 3. Considerações finais.


1. INTRODUÇÃO

No dia 31 de maio de 2023, a TMA Brasil promoveu evento online, da série “Quart@ Online”, que teve como tema “Risco Sacado”. O debate foi moderado por Rafael Pimenta, sócio de Galdino & Coelho – Pimenta, Takemi, Ayoub Advogados, teve como debatedores Renato Boranga, managing diretor de FTI Capital Advisor e Luciana Dias, sócia de LDias Advogados, e, ainda, na função de relatora do debate, a advogada Nina Lôbo, sócia do Washington Pimentel Advocacia.

Ultrapassadas as apresentações iniciais, a abertura do debate foi direcionada ao debatedor Renato Boranga.


2. O RISCO SACADO E A INTERLOCUÇÃO COM O “CASO AMERICANAS”

Ao introduzir o tema, Renato Boranga trouxe esclarecimentos iniciais necessários sobre risco sacado. No seu entendimento, risco sacado é uma forma de reduzir os prazos que as Companhias têm para cumprir suas obrigações financeiras junto aos seus fornecedores, considerando que, em uma relação comercial - de compra e venda, por exemplo -  o comprador, em regra, tem o interesse em alargar os prazos e o vendedor prefere o pagamento à vista. Ponderando essas vontades divergentes, o responsável por equilibrar a balança é a instituição financeira.

Nesta senda, o questionamento que surgem é: o risco sacado é uma operação financeira ou faz parte da operação de compra e venda?

Diante deste questionamento e passando às informações publicadas sobre o “Caso Americanas”, o debatedor apresentou que o saldo de R$ 25 bilhões se relaciona diretamente à classificação contábil do custo financeiro decorrente das suas relações comerciais, o que não pode ser considerado como resultado da companhia.

Seguindo com o debate, após pesquisa de mercado às demais empresas de varejo, observou uma mudança inicial de comportamento de mercado, com a diminuição do risco sacado. Neste sentido, apontou:

(i)    Magazine Luiza: risco sacado de aproximadamente R$ 4 bilhões, classificado como saldo de risco, mas com origem indicada em nota explicativa;
(ii)    Via Varejo: inicialmente separado entre fornecedores (geral) e fornecedores convênio, com alteração posterior da nomenclatura fornecedores convênio para risco sacado;
(iii)    Natura: anteriormente consolidava e destacava fornecedores e risco sacado, mas não abria os números. Hoje, apresentam os números, que, atualmente correspondem a cerca de R$ 500 milhões;
(iv)    Grupo Soma: não divulgaram o número do risco sacado, mas indicavam a existência de obrigações junto a fornecedores. Atualmente divulgam o valor.

Sumarizando, o debatedor concluiu que, em que pese ainda não se tenha a clareza de que o prejuízo do “Caso Americanas” decorre direta e exclusivamente do risco sacado, houve uma mudança de governança nas demais companhias de varejo, que passaram a divulgar as informações e valores de risco sacado, com a consequente melhora no disclosure e a redução das operações de risco sacado pela metade.

Finalizadas as considerações do debatedor Renato Braga, o moderador Rafael Pimenta passou a palavra a Luciana Dias, que, após agradecimentos ao TMA, passou a tratar sobre o tema, com foco em práticas de governança.

A debatedora Luciana Dias iniciou suas considerações indicando que o Brasil adota oficialmente o IFRS (International Financial Reporting Standards) em 2011, e, a partir de então, as normas regulatórias têm, em respeito aos objetivos do IFRS, considerado o estado real do status financeiro das companhias, e não somente um balanço financeiro recortado.

Isto porque, o IFRS abandona as questões formais, já tratadas nas legislações nacionais e orienta as Companhias a analisarem a essência econômica das suas ações, para que, assim, seja possível identificar as políticas contábeis críticas que a Companhia precisa discutir e adotar ajustes de controladoria.

Em geral, e em tese, o controle das políticas contábeis das Companhias é realizado pela controladoria, vinculada à área financeira, que tem como uma de suas obrigações o estudo dos pronunciamentos contábeis visando à proposição da adoção e interpretação das normas à diretoria. A diretoria deve apresentar as proposições de melhoria ao comitê de auditoria e, naquilo que discordarem, será repassado ao Conselho de Administração. Aprovadas as políticas contáveis, a companhia deve adotá-las.

Vale destacar que, em que pese já existam boas práticas de governança voltadas à adequação das Companhias às normas contábeis, a adoção do IFRS no Brasil é relativamente nova, considerando o período atual como de adaptação.

Desta forma, afirma a debatedora que o papel de desafiar a companhia em suas políticas contábeis é do Auditor (seja interno ou externo) e do comitê de Auditoria, que deverão identificar as políticas que porventura distorçam o balanço contábil, devendo levá-las ao conhecimento da diretoria para que se discuta a cadeia de governança.

Retornando ao tema base da discussão – o risco sacado – a debatedora informou que a CVM vem discutindo o tema desde 2016, tendo como ponto de partida o ano de 2015, quando um grande varejista, em discordância às considerações do auditor, vai à CVM alegando entender que a classificação do risco sacado seria contas a pagar, por se tratar de relação com o fornecedor. Já o auditor, à época, apontou a necessidade de ajustar a classificação como dívida bancária, diante das características de financiamento, como juros e prazo. Essa alteração afeta os indicadores da empresa.

Relacionado ao “Caso Americanas”, sopesando a relevância do valor em aberto – aproximadamente R$ 20 bilhões – a debatedora Luciana Dias acredita que não foi somente a classificação equivocada dos números que levou à situação atual da Companhia. É preciso acompanhar e avaliar como a CVM vai tratar das peculiaridades do caso.

Sobre a atuação da CVM, foram abertos 12 (doze) processos, dos quais 09 (nove) investigam a responsabilidade de agentes de mercado envolvidos, como a agência de rating; coordenadores de oferta pública; controladores; membros do conselho de administração; administradores anteriores. Ou seja, será um caso emblemático, principalmente se comparado ao case considerado icônico anteriormente – Caso do Banco Pan, com um valor envolvido de cerca de R$ 2,5 milhões.

Apresentadas as considerações sobre a possível e provável atuação da CVM no “Caso Anericanas”, a debatedora Luciana Dias lembra que a CVM permite que as Companhias segurem informações que possam interferir no valor das ações, até que possa identificar a origem do problema e elaborar um plano de ação para solucioná-lo. Deste modo, questiona-se a tomada de decisão dos gestores à época da divulgação das informações do “Caso Americanas”, sem a apresentação de plano de ação ou sequer a origem do problema.

Diante disto, Renato Boranga questiona como poderia ter sido essa divulgação. Um varejista, como a Americanas, precisa que a sua imagem ao consumidor seja confiável, ele diz. Assim, mostra-se o dilema entre o dever de divulgar e o dever de preservar o valor da companhia, ambos legítimos.

Retornada a discussão para a debatedora Luciana Dias, a mesma aponta que esse tipo de discussão está bem avançada nos Estados Unidos, inclusive com os deveres bem definidos de cada figura envolvida nas questões contábeis da Companhia, o que ainda não ocorreu no Brasil.

Passada a palavra ao moderador, Rafael Pimenta, questionou se a conduta do ex-CEO, Sérgio Rial, em identificar o problema e logo em seguida divulgar a sua saída da Companhia seria legítima. Em resposta, Luciana Dias assevera que, até que a CVM entenda quanto ele sabia sobre o tema, não é possível culpar o Executivo.

Aberta a palavra aos alunos, foram recebidas duas perguntas, do expectador Flávio Lopes, abaixo: 
(i)    Poderiam comentar um pouco mais sobre a responsabilidade da auditoria, quanto à sua obrigação de "desafiar" as informações?
(ii)    E sobre os desdobramentos dessa responsabilidade agora em relação a auditoria?

Luciana Dias, em resposta, ressaltou que o papel da auditoria é desafiar e, nessa magnitude de discrepância, seria esperado que a auditoria ao minimamente questionasse as classificações e dados financeiros. Por isso, é importante entender as informações a que as figuras envolvidas tiveram acesso e refazer o questionamento para que se esclareça como, dentro de uma Companhia robusta como as Americanas, este assunto poderia ter se desenrolando durante tantos anos sem o conhecimento das pessoas envolvidas.

Finalizado o debate, o moderador, Rafael Pimenta, passou a palavra à relatora, Nina Lôbo, que apenas corroborou aos argumentos dos debatedores, trazendo a percepção de que “Caso Americanas” trará diversas mudanças regulatórias e legislativas envolvendo o tema risco sacado e demais capítulos de governança e mercado financeiro.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por derradeiro, em considerações finais, a debatedora Luciana Dias ressaltou que é possível vislumbrar mudanças de práticas de governança dentro de companhias e auditorias. Ademais, recentemente, em 25 de maio de 2023, a revista Valor Econômico publicou que norma para divulgação de risco sacado entra em vigor a partir de 2024. Em que pese estas alterações não decorram do “Caso Americanas”, poderão afetar a empresa.

Autor(a)
Nina Lôbo de S. Barbosa, Advogada e sócia do Washington Pimentel Advocacia.
Informações do autor
Atuante nas áreas de planejamento tributário e reestruturação de empresas em recuperação judicial e insolventes.
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