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Café da Manha São Paulo - Aspectos polêmicos envolvendo o Plano Alternativo apresentado pelos Credores

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Em 19 de setembro de 2022, o TMA Brasil promoveu em sua sede evento híbrido moderado pelo Dr. Gledson Marques de Campos, sócio do Trench Rossi Watanabe para discussão do tema “Aspectos polêmicos envolvendo o Plano Alternativo apresentado pelos Credores”, que contou com a participação dos debatedores Prof.ª Adriana Pugliesi, Dr. Marcelo Vieira von Adamek e da Exma. Dra. Renata Mota Maciel com relatoria de Raquel Moraes Vedovello Dias.

Após apresentação de todos os integrantes, o moderador Gledson informou que de todas as modificações trazidas pela Lei 14.112 de 24 de dezembro de 2020, a qual reformou substancialmente dispositivos da Lei nº11.101/05 (LRE), a possibilidade de apresentação de plano alternativo pelos credores é um dos temas mais controvertidos.

Antes da reforma, somente os devedores poderiam apresentar o Plano de Recuperação Judicial, o que gerava certa pressão aos credores de que caso as disposições do Plano de Recuperação Judicial apresentada pelo devedor não fossem acolhidas, a consequência seria a falência, o que pioraria a situação do credor.

   A premissa apresentada aos credores era a seguinte: “Aprova as disposições do Plano de Recuperação Judicial apresentado ou a consequência será a falência”. Dessa forma, os credores premidos dessa argumentação, muitas vezes acabavam por aprovar Plano de Recuperação Judicial que não lhes atendiam.

Nesse aspecto, a reforma introduzida pela Lei 14.112, que previu a possibilidade de os credores apresentarem plano alternativo trouxe uma certa paridade entre credores e devedores em algumas hipóteses. No entanto, as discussões sobre o tema são inúmeras. Na opinião do Gledson, parece que o legislador falou menos do que deveria, porque não houve o cuidado em detalhar a implementação dessa novidade.

Todos os aspectos polêmicos desse tema podem ser observados no processo da SAMARCO, que teve apresentação de Plano de Recuperação Judicial de mais de um credor, além da apresentação de pareceres de juristas renomados.

Feita introdução sobre a possibilidade decorrente da reforma da lei de apresentação de plano alternativo pelos credores, em que se pontou o equilíbrio imaginado pelo legislador com essa alteração, assim como as dificuldades decorrentes da reforma, o moderador passou às questões.

A primeira pergunta sobre a existência ou não de eventuais requisitos a serem cumpridos pelos credores para apresentação do Plano de Recuperação Judicial, assim como a  suficiência do prazo de 30 (trinta) dias para os credores apresentarem Plano de Recuperação Judicial foi direcionada para a Adriana.

Ela respondeu que a lei é clara que os credores devem preencher os requisitos do art. 53 e seus incisos I a III, da Lei nº11.101/05[1]. Segundo o entendimento dela, a exigência é, de certa forma, descabida, porque os credores não têm condição de ter acesso pelo às informações da companhia, exceto aqueles documentos disponibilizados nos próprios autos. Não há como o plano dos credores partir de outra premissa que não dos documentos disponibilizados nos próprios autos. O problema disso é que se a informação apresentada pelo devedor não for concisa, a premissa dos credores será equivocada.

Quanto ao questionamento sobre o prazo de 30 (trinta) dias, já se ouviu muitas reclamações. Contudo, a ideia é que o plano dos credores seja resultado de negociação contínua com o devedor durante o processo de recuperação judicial. Por isso, o plano alternativo somente será apresentado, caso não haja aprovação do Plano de Recuperação Judicial regular ou por cram down. O que acontece nessa hipótese é que os credores terão 30(trinta) dias para ajustar o que foi proposto.

A segunda hipótese de apresentação do plano alternativo é de que o devedor excedeu o prazo legal do stay period e sua prorrogação (180 dias + 180 dias). Essa hipótese se caracteriza pelo devedor reticente que não quer acolher a sugestão da maioria dos credores e está com dificuldade na aprovação do plano de recuperação judicial apresentado por ele.

Para a Adriana, o prazo não é exíguo se analisado pela sistemática da lei. Isso porque, a consequência do plano alternativo dos credores é suspender o prazo do stay period por mais 180 (cento e oitenta) dias, a fim de possibilitar a negociação do plano dos credores.

Por isso, a lógica dos 30 (trinta) dias faz sentido, pois na verdade são os 60 (sessenta) dias de apresentação do plano do devedor, acrescido de mais 30 (trinta) dias para  apresentação do plano pelos credores, que tem o objetivo de evitar o prolongamento indefinido do stay period e do processo recuperacional.

O moderador acrescentou que parece que o legislador tentou estabelecer um período de exclusividade ao devedor para apresentação do plano de recuperação judicial e a lei é bastante clara ao estabelecer os prazos para o devedor apresentar e aprovar o plano.

 Gledson informou que a hipótese prevista no artigo 56, §4ª da LRE[2] dispõem que, no caso de haver rejeição do Plano de Recuperação Judicial do devedor em Assembleia Geral de Credores, o Administrador Judicial concederá o prazo de 30 (trinta) dias para os credores apresentarem plano. Porém, questionou ao Marcelo o que ocorre quando não há assembleia. E, mais, indagou se a assembleia que analisará o plano do credor será nova e como será efetuado o cálculo desse quórum.

Marcelo respondeu que a Lei nº14.112/2020 introduziu uma legitimação que ele chama de derivada, subordinada ou condicionada a que os credores possam apresentar um plano sempre em uma recuperação judicial iniciada pelo devedor, desde que presentes dois requisitos: (i) incapacidade de aprovação do plano do devedor dentro do prazo;

(ii) aprovação de oportunidade de apresentação de plano por parte da maioria simples ou universal dos credores presentes no conclave assemblear convocado para aprovação do plano de recuperação judicial do devedor.

Essa segunda situação, que talvez seja a mais verificada na prática, que é a situação do plano ser rejeitado em Assembleia de Credores pela maioria dos credores, onde abre-se a possibilidade de apresentação do plano alternativo, será mais fácil definir o quórum, pois será a maioria dos créditos presentes daquela assembleia integrados pelas pessoas aptas a votar naquele conclave.

Porém, no caso da primeira hipótese, que é da impossibilidade ou rejeição ficta do plano, porque não foi aprovado dentro do prazo legal previsto, o art. 6º, §4º-A, da LRE abre a possibilidade de os credores apresentarem plano alternativo e remete a forma do art. 56, §§ 4º, 5º, 6º e 7º, da LRE[3].

Neste caso, a interpretação mais razoável é de que é necessário convocar uma Assembleia para deliberar sobre a possibilidade de apresentação de plano alternativo pelos credores, de modo que não é facultado a qualquer dos credores fazer apresentação do plano alternativo, por força da remissão do devedor, sem aprovação do conclave.

Uma vez aprovada a possibilidade de apresentação de plano alternativo, há necessidade de convocação de nova Assembleia para deliberação do plano alternativo e essa AGC é uma nova assembleia, de modo que é preciso fazer novo edital, nova habilitação e eventualmente o universo de votantes será diferente da anterior.

Nessa situação, não se trata de continuação do conclave anterior, mas um novo, o que poderá abrir discussão sobre quem estará apto para votar, além de quem estará impedido a exercer o direito de voto.

O moderador, então, direcionou à Renata, questionamento sobre a hipótese de no caso de haver o conclave aprovando a apresentação de plano alternativo, é possível um credor apresentar plano outrora rejeitado ou  se é possível a apresentação de credores apresentarem planos, isto é, mais de um credor apresentar plano alternativo. Além disso, foi questionado se nesta hipótese o mesmo credor poderá ser contabilizado para o quórum de aceitação.

Renata comentou que não parece o esperado pela legislação que sejam apresentados mais de um plano pelos credores. Porém, a lei não impede, o que cria problemas, pois, a depender do quórum de votação ficará complicado analisar quem decidirá o plano que será aprovado. Resumiu que na prática pode acontecer e que a lei não veda.

As consequências dessa hipótese aventada, no entanto, são preocupantes, no sentido de que não há previsão legal de qual parte envolvida decidirá sobre qual plano será o válido. Na opinião dela, parece acertado levar ao conclave assemblear deliberar.

Com relação aos impedimentos do direito de voto, a problemática é ainda maior, por exemplo, no caso de o sócio da devedora ser credor também. Nesse caso, embora não possa votar no plano apresentado pela devedora, no caso do plano alternativo, a princípio cessa esse impedimento.

Outra problemática aventada pela magistrada será sobre a possibilidade de se ventilar uma conduta de venire contra factum proprium quando houver a apresentação do mesmo plano rejeitado apenas com pequenos pontos alterados, tendo em vista a rejeição de um plano pelo credor e na sequência a apresentação do mesmo plano por ele. Neste caso, a devedora deverá anuir com o plano?

Por fim, concluiu que são questões muito delicadas e que  o caso da SAMARCO será um grande paradigma, porque há grandes questões a serem desenroladas naquele processo recuperacional.

Diante dos muitos cenários apresentados, o moderador indagou o Marcelo sobre a existência de alguma vedação legal para o exercício do direito de voto dos sócios da devedora no plano alternativo, pois a vedação prevista no artigo 43, da LRE[4] de que o sócio da devedora não pode votar no plano apresentado por ela. Contudo, a lei é omissa sobre o exercício do direito de voto desses sócios no plano alternativo dos credores.

Marcelo lembrou que os credores têm direito de voz sobre o plano alternativo em três momentos:

  • Inicial: quando é dada a concessão da oportunidade de apresentação do plano alternativo no prazo de 30 dias;
  • Intermediário: apoio prévio que será uma condição para apresentação do plano que eventualmente será submetido à votação (25% a 35%);
  • Final: a assembleia que eventualmente aprovará o plano alternativo.

Eventualmente, no momento intermediário com a apresentação de mais de um plano, ele concorda com a Renata de que a lei não disciplinou e talvez o legislador não tenha imaginado tal situação. Mas parece que deverá haver a admissão de tantos planos quanto forem apresentados, até porque do contrário não será possível definir quem será o habilitado para participar e votar do conclave, pois haverá interesses conflitantes na própria confecção do plano. Nesse contexto, todos os planos deverão ser submetidos à votação.

Sobre a questão do credor que também é sócio da devedora, Marcelo pontuou que se aplica linearmente o artigo 43, que trata de uma situação excepcional quase sem nenhum paralelo em nenhuma legislação do mundo. Essa é o posicionamento da jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo que tem interpretado a impossibilidade do direito de voto de forma restritiva, isto é, caso o sócio não tenha nenhum poder diretivo na sociedade, não há razões concretas para tolher-lhe o exercício do direito de voto.

Para ele, o impedimento do direito de voto sempre se justifica por dois princípios: (i) porque ninguém pode ser juiz em causa própria; (ii) as regras que restringem a situação de negócios consigo mesmo.

Este último se refere ao impedimento do plano do devedor. Já no plano do credor, o poder de ingerência do sócio não é diferente de qualquer outro credor da devedora. Por isso, ele conclui que não há óbice para o exercício no direito de voto do sócio da devedora no plano alternativo.

Adriana pediu a palavra para manifestar posicionamento diferente do Marcelo sobre a possibilidade de exercício de voto do sócio da devedora. Para ela, no ambiente da Assembleia Geral de Credores não é possível traçar um paralelo com o direito societário que determina que os sócios estão obrigados a  exercer o voto pelo interesse da companhia. Trata-se de um vínculo em virtude de lei.

Porém, na recuperação judicial existe um vínculo acidental entre a comunidade de credores, que estão reunidos somente por possuírem crédito de um devedor comum. Existe um conflito ex ante, quer dizer, o que potencialmente o devedor quer, não é o que potencialmente os credores querem.

Aliás, não há uniformidade de interesses entre os próprios credores. Não existe, neste caso, uma regra de que uma parte ou outra sejam obrigadas a votar no interesse da devedora. Por essa razão, a lei cria um ambiente estruturado para debate.

Nesse aspecto, os credores não estão obrigados a aceitar o plano do devedor, o eles não podem fazer é conluio com o devedor para prejudicar os demais credores da mesma classe ou de classes diferentes.

Na opinião dela, o voto do sócio do devedor que também é credor da companhia deve ser obstado, sob a justificativa de que o artigo 43, da LRE não se aplica indiscriminadamente, baseado até mesmo nos documentos contábeis apresentados pelas devedoras no momento da distribuição do pedido de Recuperação Judicial.

 Para ela, quando o patrimônio líquido da devedora está negativo, significa que a companhia já pertence aos credores. Por isso, há necessidade de chamá-los para opinar, a fim de proporcionar uma terceira via entre o plano do devedor e a falência. Por essa razão, defende que o sócio da devedora não pode votar no plano alternativo, porque aquele sócio do devedor que é credor é também quem está colocando obstáculos para aprovação do plano do devedor. 

 Adriana então defendeu que seria óbvio a não apresentação de voto do sócio do devedor. Existe um conflito insuperável, porque o sócio do devedor não deve votar. O sócio do devedor que é credor também não está autorizado a votar. Utilizou a interpretação do art. 43, juntamente com normas do direito norte-americano, que é a inspiração da lei. No cenário do Chapter 11, a estrutura é pulverizada. Na existência de cram down, os sócios também não podem votar se os unsecurities debtors não estiverem 100% satisfeitos. Aqui, o controle é concentrado e o controlador não integra a classe de credores.

Diante de toda a argumentação apresentada, ela defende que o voto do sócio que também é credor não deve ser contabilizado.

O Marcelo pediu a palavra para apresentar quatro argumentos de contrapontos:

  • Primeiro, se é verdade que dentro da comunhão involuntária de credores não há um interesse comum, isso comprova que o impedimento não deveria permanecer, pois deixaria de existir o conflito de interesses;
  • Segundo no que diz respeito a posição do sócio, há sócio apenas investidor, e essa contabilização  não estará no capital social, mas no passivo de curto ou longo prazo ou em outra subconta, no caso do “AFAC”. E, isso não é capital social;
  • Terceiro,  a Lei 14.112 andou no sentido de privilegiar o sócio credor que faz suprimento de mercado na falência;
  • Quarto, a prevalecer a ideia de que sócio da devedora tem que ser escanteado, haverá uma autêntica expropriação, por exemplo no caso do sócio minoritário, porque ele não é ouvido no conclave, não tem influência na administração da companhia e não tem controle desta. No direito europeu, por exemplo, quando os sócios enquanto credores tem sua posição jurídica atingida, devem que ser ouvido.

A Adriana acrescentou que o recurso não entrou no capital social da companhia. Porém, se o sócio credor deseja aportar valores na companhia, questiona a razão dele ter ingressado com pedido de recuperação judicial. Para ela, quando ele aporta em mútuo anterior do pedido de recuperação judicial, ele transfere o risco aos credores. Na falência, tal ato é revogável. Isso faz com que o devedor tenha o total controle e, com isso, direciona o processo recuperacional.

Quando o devedor vai aportar recursos posterior ao pedido, existe o procedimento do DIP (debtor in possession), que abre também para outras pessoas aportarem em condições mais favoráveis por vezes e, neste caso,  há necessidade de autorização judicial. Sob essas justificativas, Adriana concluiu que não vê como o credor remitente possa exercer direito de voto e, eventualmente, derrubar um plano alternativo dos credores.

Por fim, a Renata observou que, como regra, não acha que possa afastar o direito de voto do sócio do devedor em todos os casos. Para ela, o juiz terá que analisar todas as premissas apontadas pela Adriana, quando for se manifestar.

Na opinião da Renata, a dificuldade é partir da premissa que sempre haverá vedação. Mas evidente que no caso concreto deverá se verificar o conflito de interesse que, a princípio, não deve ser presumido. São premissas que precisarão ser pensadas e analisadas pelo magistrado.

O cuidado deve ser no sentido de não tratar o fato como proibido sempre, pois o conflito de interesse nem sempre existirá, até porque, se o sócio da devedora não for afastado, quem cumprirá o plano de recuperação judicial será ele.

Em prosseguimento, o moderador explicou que ficou claro a diferença de opiniões antagônicas e a terceira via apresentada, de que alguns casos podem votar. Então, aproveitou para indagaraos painelistas se cabe cram down no plano alternativo.

Para a Adriana, não caberá. O quórum é de aprovação. A lei não fala nada sobre a possibilidade. Porém, pontuou que, em se tratando de Brasil, ela tem receio em se manifestar sobre tal proibição.

Por sua vez, para a Renata, a lei não fala desse cenário em expectativa.  Ela não acha improvável de existir, pois além da heterogenia de interesses, há situações entre credores brigando entre si. Nesse aspecto, ela não acha improvável acontecer, em caso de haver grupo dissidente, que eventualmente não tenha todos os pedidos  acolhidos, e haja a possibilidade de levar a análise ao juízo. Pondera que não é o mais adequado, mas não improvável de acontecer.

Gledson considerou que a criatividade do advogado é enorme e invariavelmente vai ser apresentado. Questionou, então, sobre a possibilidade do plano alternativo estabelecer aumento de capital social da devedora e se há diferenças entre os meios de recuperação judicial apresentados no plano de recuperação judicial do devedor e do credor.

Marcelo respondeu que para ele, pouco importa qual a forma de apresentação do plano, mas que é necessário cumprir  a lei. Não há superioridade de apresentação. Se houver a previsão de reorganização societária, que a lei determina a manifestação dos sócios, eles deverão ser consultados. Neste caso, se não houver prévia aprovação dos sócios em Assembleia de acionista para eventual aumento de capital, posteriormente da apresentação do plano de recuperação judicial, haverá descumprimento do PRJ e a consequência será a falência.

Ponderou que é verdade que no art. 56, §7º da LRE  foi previsto de maneira indevida de que há direito de retirada do sócio do devedor, mas ainda assim, o direito de recesso, até pela sua função, não importa dizer da suficiência de sua aprovação, até porque, o sócio não tem o local adequado de ser ouvido.  

Adriana comentou que quando importar reorganização societária depende de assembleia dos sócios. Nesse aspecto, separou as hipóteses de aumento de capital em duas:

  • Aumento de capital através da conversão de dívida em equity, passa por aprovação da assembleia. Não há dúvida da possibilidade dessa situação. E não prescinde da aprovação do devedor;
  • Se o plano alternativo previr o aumento de capital social pelo acionista. Neste  caso, o poder judiciário deverá glosar tal previsão, pois o plano alternativo não poderá implicar em situação pior do devedor que a falência, por isso, o plano alternativo não pode impor aos acionistas o aporte de capital

Ao explicar essas hipóteses a Adriana citou precedente da Oi S.A. que previa a conversão da dívida em equity e o controlador se opôs a essa previsão. Foi necessário convocar a assembleia de acionista. Naquele momento, a disputa era se o controlador votaria ou não. Decisão liminar decidiu que o controlador não poderia votar. Porém, não há decisão final, porque a lide terminou em acordo.

Gledson trouxe novamente ao debate o artigo 56 da LRE e indagou sobre a impossibilidade de o plano alternativo estabelecer situação pior ao devedor e se há possibilidade de prever tratamento diferenciado para credor sócio e demais credores.

Para Renata, há necessidade de entender qual é a par condition. Não é possível afirmar que um credor sócio vai estar na mesma situação que outro. Pelo que está escrito, parece que a lei não permite a piora da situação do sócio credor, até porque, ele não está na mesma posição de outros credores.

Foi  pontuado pelo moderador que essa situação de “piora” do sócio credor se verifica no caso da SAMARCO em que há taxa de desconto maior do credor sócio do que o não sócio.

Ao comentar, Marcelo pontuou que é necessária uma regra geral, se dissociando do caso SAMARCO. Por isso sobre a ótica da lei concordou com a Renata de há preceito de difícil manejo, principalmente no que se refere a demonstração de maior ou menor sacrifício. Concordam, nesse aspecto que há muita margem para a discussão.

Ressalvou, porém,  que, ao seu ver, o inciso VI do 56, da LRE,  a seu ver o legislador se refere ao sócio enquanto sócio e não sócio como devedor. Caso não fosse assim, a regra permitiria que o sócio não credor poderia ter a situação piorada, o que não é verdade.

Para ele, aplica-se ao caso, jurisprudência sobre a criação de subclasses, em que há possibilidade de criação, desde que ela não seja discriminatória. A lei trata o sócio minoritário e sem qualquer ingerência como se ele não existisse e, piorar sua situação não parece a melhor solução.

Para encerrar o debate, Gledson indagou sobre a possibilidade de responsabilizar eventual credor que apresentou o plano alternativo no caso de descumprimento do plano alternativo pela devedora.

Na opinião da Renata há diversos problemas para serem considerados. Segundo seu ponto de vista, o ideal é trabalhar com a possibilidade de quórum, em que a aprovação será realizada pelos credores, o que fomentaria os interesses heterogêneos dos credores. Todavia, não acha saudável para o sistema a alegação de responsabilidade, mas tal fato deve ser analisado pelo juízo em controle de legalidade.

Adriana tende a concordar com a Renata no sentido de lidar com sistema de maiorias. A regra tem que ser exatamente a mesma para o cumprimento do plano do devedor. No primeiro momento, a falência não é desejada por ninguém, pois a experiência da legislação brasileira é de que é melhor fazer a liquidação antecipada na recuperação judicial do que na falência, em que há paralisação de atividade e perda de valor do ativo. Nesse aspecto, há um ponto de convergência de que todos buscam a reestruturação. Mas não é possível implicar na responsabilização por algum ilícito.

Por essa razão, a opinião da Adriana é de que deve ser aplicado como regra de responsabilização a mesma lógica do plano de recuperação judicial do devedor convolado em falência.

No entanto, o Marcelo acha que há necessidade de separar a responsabilidade civil. Em uma análise sob a ótica do proponente do plano, em condições normais, não há responsabilidade. Mas há ressalvas, porque pode haver manipulação de quórum o que pode ocasionar questionamentos posteriores sobre a responsabilização do proponente.

 Outra coisa é colocar a responsabilidade pelo exercício do direito que resultam do plano, que colocam alguns credores estratégicos na condição de controladores externos. E nesse caso, não se vê salvaguarda, pois quem tem controle, tem responsabilidade. Neste caso, na opinião dele, deve haver responsabilidade pelo ato praticado pelo controlador.

Encerrada as perguntas, o moderador abriu a possibilidade da plateia realizar perguntas, quando foi apresentada a seguinte pergunta:

Qual é a opinião da banca sobre a celebração de negócio jurídico processual que regulamenta condições futuras do plano, seja ele dos credores ou do devedor, por exemplo no caso de support agreement.

Marcelo agradeceu a pergunta e pontuou que se trata do mais moderno no direito concursal, o qual batizou de “pactos paraconcursais”, em que deverá haver um controle no caso concreto. A reforma da lei aprimorou, mas faltou o mecanismo de coordenação para controle de credores estratégicos. Faltou um disclousure statement . Faltou regulamentação. No entanto, ainda com instrumentos legais faltantes, opinou que, em princípio, desde que esses acordos promovam a eficiência e coordenação dos interesses e não se contraponham a outras regras, são possíveis.

Gladson complementou que se trata de negócio jurídico atípico, que pode tudo que não for proibido e há muita ressalva em celebração desses negócios.

Adriana opinou que as partes podem decidir o que quiserem entre elas, mas não pode afetar terceiros. Ela tem dúvidas se precisava disciplinar. Para o Brasil, ela acha até benéfico não ter disciplina, para não haver dúvida se pode ou não a celebração. Os credores precisam se coordenar. A solução para melhor eficiência da RJ é a coordenação entre os credores, porque a negociação avança para um patamar mais equilibrado. Trata-se de um trunfo do devedor a desorganização dos credores.

Marcelo complementou que vê acordos entre devedor e alguns credores. Mas aí tem dúvidas sobre o controle substancial do voto. Mas concorda que é um tema difícil pensar o que era ideal.

Adriana, porém, não acha que pode haver um pacto entre o devedor e o credor para auferir vantagem, pois em tese incidiria ilícito penal, na medida em que o credor está auferindo vantagem que outros credores da mesma classe, beneficiando-se em detrimento dos demais. O benefício deverá ser para todos os credores, desde que atingido o quórum.

Marcelo pontou que tem dúvida se esses acordos não deveriam ser objeto de divulgação, até para facilitar a apuração de eventual benefício, quando Gledson acrescentou que, de alguma forma, essas negociações refletirão no plano alternativo, até para torna-lo exequível.

Renata concorda com Marcelo.

Por fim, Gledson declarou o painel por encerrado e agradeceu a participação e presença de todos.

 

 

 

 

[1] Art. 53. O plano de recuperação será apresentado pelo devedor em juízo no prazo improrrogável de 60 (sessenta) dias da publicação da decisão que deferir o processamento da recuperação judicial, sob pena de convolação em falência, e deverá conter: I – discriminação pormenorizada dos meios de recuperação a ser empregados, conforme o art. 50 desta Lei, e seu resumo; II – demonstração de sua viabilidade econômica; e III – laudo econômico-financeiro e de avaliação dos bens e ativos do devedor, subscrito por profissional legalmente habilitado ou empresa especializada.

[2] Art.56, §4º. Rejeitado o plano de recuperação judicial, o administrador judicial submeterá, no ato, à votação da assembleia-geral de credores a concessão de prazo de 30 (trinta) dias para que seja apresentado plano de recuperação judicial pelos credores.

[3] § 5º A concessão do prazo a que se refere o § 4º deste artigo deverá ser aprovada por credores que representem mais da metade dos créditos presentes à assembleia-geral de credores.

§ 6º O plano de recuperação judicial proposto pelos credores somente será posto em votação caso satisfeitas, cumulativamente, as seguintes condições: I - não preenchimento dos requisitos previstos no § 1º do art. 58 desta Lei;  II - preenchimento dos requisitos previstos nos incisos I, II e III do caput do art. 53 desta Lei;  III - apoio por escrito de credores que representem, alternativamente:     

a) mais de 25% (vinte e cinco por cento) dos créditos totais sujeitos à recuperação judicial; ou      

b) mais de 35% (trinta e cinco por cento) dos créditos dos credores presentes à assembleia-geral a que se refere o § 4º deste artigo; 

IV - não imputação de obrigações novas, não previstas em lei ou em contratos anteriormente celebrados, aos sócios do devedor; 

V - previsão de isenção das garantias pessoais prestadas por pessoas naturais em relação aos créditos a serem novados e que sejam de titularidade dos credores mencionados no inciso III deste parágrafo ou daqueles que votarem favoravelmente ao plano de recuperação judicial apresentado pelos credores, não permitidas ressalvas de voto; e  VI - não imposição ao devedor ou aos seus sócios de sacrifício maior do que aquele que decorreria da liquidação na falência.

§ 7º O plano de recuperação judicial apresentado pelos credores poderá prever a capitalização dos créditos, inclusive com a consequente alteração do controle da sociedade devedora, permitido o exercício do direito de retirada pelo sócio do devedor

 

[4] Art. 43. Os sócios do devedor, bem como as sociedades coligadas, controladoras, controladas ou as que tenham sócio ou acionista com participação superior a 10% (dez por cento) do capital social do devedor ou em que o devedor ou algum de seus sócios detenham participação superior a 10% (dez por cento) do capital social, poderão participar da assembleia-geral de credores, sem ter direito a voto e não serão considerados para fins de verificação do quórum de instalação e de deliberação.

Autor(a)
Raquel Moraes Vedovello Dias, Advogada Advocacia De Luizi
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