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CESSÃO FIDUCIÁRIA DE RECEBÍVEIS FUTUROS E RECUPERAÇÕES JUDICIAIS

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A teor do que dispõe o artigo 49, §3º da Lei 11.101/2005 (“LRF”), os créditos garantidos pela cessão fiduciária de recebíveis não se sujeitam aos efeitos da recuperação judicial (“RJ”).
Atualmente, para fins de aplicabilidade da exceção do artigo mencionado, debates têm sido travados nas RJs acerca da diferença entre recebíveis já performados e aqueles a performar quando deferido o processamento da RJ.
Nos últimos anos, o Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) firmou entendimento  de que o momento em que o recebível é performado é irrelevante para fins de sujeição do crédito à RJ, pois este é de propriedade, ainda que resolúvel, do credor, e não da recuperanda. O racional apresentado é que a constituição da propriedade fiduciária oriunda da cessão fiduciária de títulos de crédito dá-se a partir da própria contratação, inexistindo na lei distinção entre os créditos constituídos antes ou após o pedido de RJ . 
Apesar do entendimento consolidado do STJ, a questão ainda não está sedimentada em todos os Tribunais Estaduais. 
As Câmaras do TJRJ, em maioria , têm seguido os parâmetros estabelecidos pelo Tribunal Superior. Contudo, decisões em sentido contrário não deixaram de ser proferidas, como se verifica do julgamento do AI 0048201-86.2021.8.19.0000 , por meio do qual foi impossibilitada a retenção de “créditos fiduciários futuros, estes que, como não existiam quando da decretação da recuperação, não podem ser liberados a favor do credor devendo ser protegidos para possibilitar a recuperação”.
No que tange ao TJSP, fez-se clara a divergência entre a interpretação das Câmaras Reservadas de Direito Empresarial. A 1ª Câmara tem respeitado o entendimento do STJ , como se verifica pelo julgamento do AI 2053542-30.2022.8.26.0000 , no qual se estabeleceu que “negar a validade da garantia fiduciária representada pela cessão fiduciária de recebíveis futuros, quando claramente as condições contratadas para a liberação dos recursos tenham nesta garantia o pressuposto da contratação, implica ofensa à boa-fé“. Já na 2ª Câmara , o entendimento prevalecente é que, para fins da extraconcursalidade do art. 49, §3º, da LRF, a garantia deve ser restrita aos créditos performados até a data do ajuizamento da RJ.
Já no TJPR, as decisões seguem o entendimento do STJ . O Rel. Marcelo Gobbo, integrante da 18ª Câmara Cível, no âmbito do AI 0040586-97.2019.8.16.0000 , estabeleceu que o deferimento do processamento da RJ não seria suficiente, por si só, para descaracterizar a garantia fiduciária dos recebíveis futuros, visto que é formada a partir da constituição. Igualmente, verificou-se da análise de decisões do TJRS , TJGO  e TJSC .
Como demonstrado, o fato de haver um entendimento consolidado no STJ não serviu para nortear todos os Tribunais Estaduais acerca da classificação do crédito garantido pela cessão fiduciária de recebíveis a performar, o que pode ocasionar um desestímulo (e encarecimento) às novas estruturações de garantias e concessões de crédito.

 

1.  AgInt no REsp: 2032341, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 16.10.2023, Terceira Turma; REsp: 2033283, Rel. Marco Buzzi, j. 26.05.2023, Quarta Turma; REsp 1778596, Rel. Marco Aurélio Bellizze, j. 16.03.2023, Terceira Turma; AgInt no REsp n. 1706063, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, j.27.06.2022, Quarta Turma, REsp 2024101, Rel. Marco Aurélio Bellizze, j. 21.09.2023, Terceira Turma; AgInt nos EDcl nos EDcl no AREsp n. 1885016, Rel. Nancy Andrighi, j. 25.04.2022, Terceira Turma; AgInt no REsp 1932780, Rel. Marco Aurélio Bellizze, j. 29.11.2021, Terceira Turma; AgInt nos EDcl no AgInt no REsp 1816967, Rel. Marco Aurélio Bellizze, j. 31.08.2020, Terceira Turma; REsp 1797196, Rel. Marco Aurélio Bellizze, j. 09.04.2019, Terceira Turma.

2.  Especificamente sobre as cédulas de crédito bancárias, também é destacado que a Lei 10.931/2004 permite que sejam garantidas pela cessão fiduciária de recebíveis futuros, o que inviabiliza a especificação do título, ainda não emitido.

3.  AI 0085081-43.2022.8.19.0000, Rel. Celso Silva Filho, j. 17/05/2023, 23ª Câmara Cível; AI 0019662-13.2021.8.19.0000, Rel. Antonio Iloizio Barros Bastos, j. 15.09.2021, 4ª Câmara Cível; AI 0022426-69.2021.8.19.0000, Rel. Antonio Iloizio Barros, j. 15.09.2021, 4ª Câmara Cível; AI 0060095-93.2020.8.19.0000, Rel. Antonio Carlos Arrabida Paes, j. 16.12.2020, 23ª Câmara Cível. AI 0020664-86.2019.8.19.0000, Rel. DENISE LEVY TREDLER, j. 24.09.2020, 21ª Câmara Cível; AI 0001727-28.2019.8.19.0000, Rel. Cleber Ghelfenstein, j. 24.07.2019, 14ª Câmara Cível.

4.  Rel. Cristina Tereza, j. 25.01.2022, 5ª Câmara Cível do TJRJ. No mesmo sentido: AI 0038473-84.2022.8.19.0000, Des. Rel. Denise Nicoll Simões, j. 13.09.2022, 5ª Câmara Cível do TJRJ.

5. AI 2259793-46.2023.8.26.0000, Rel. J. B. Franco de Godoi, j. 05.02.2024; AI 2147949-91.2023.8.26.0000, Rel. Fortes Barbosa, j. 14.09.2023; AI 2106227-48.2021.8.26.0000, Rel. Azuma Nishi, j. 29.09.2021; AI: 2053542-30.2022.8.26.0000, Rel. Azuma Nishi; AI 2199372-95.2020.8.26.0000, Rel. Sérgio Shimura, j. 24.06.2021.

6.  j. nb 21.09.2022.

7.  AI 2239208-07.2022.8.26.0000, Rel. Jorge Tosta, j. 25/08/2023; AI 20679278020228260000, Rel. Grava Brazil, j. 14.06.2022; AI 2191193-41.2021.8.26.0000, Rel. Jorge Tosta, j. 01.06.2022; AI 2193469-45.2021.8.26.0000, Rel. Grava Brazil, j. 22.10.2021; AI 2176128-40.2020.8.26.0000; Rel. Des. Araldo Telles, j. 11.02.2021; AI 2182952-15.2020.8.26.0000, Rel. Araldo Telles, j. 14.10.2020; AI 2256696-77.2019.8.26.0000; Rel. Araldo Telles, j. 25.08.2020.

8.  No mesmo sentido: AI 0095735-39.2023.8.16.0000, Rel. Luiz Henrique Miranda, j. 25.10.2023, 18ª Câmara Cível; AI 0027768-74.2023.8.16.0000, Rel. Luiz Henrique Miranda, j. 27.09.2023, 18ª Câmara Cível; AI 00031133820238160000, Rel. Ana Paula Kaled, j. 03.07.2023, 18ª Câmara Cível; AI 0050428-96.2022.8.16.0000, Rel. Tito Campos de Paula, j. 13.02.2023, 17ª Câmara Cível; AI 0056077-76.2021.8.16.0000, Rel. Ana Paula Kaled, j. 04.05.2022, 18ª Câmara Cível; AI 0040542-49.2017.8.16.0000, Rel. Rosana Amara Girardi Fachin, j. 06.12.2018, 17ª Câmara Cível.

9.  j. 12.12.2019, 18ª Câmara Cível.

10.  AI 5348783-49.2023.8.21.7000, Rel. Gelson Rolim Stocker, j. 07.02.2024, 6ª Câmara Cível; AI 5303981-63.2023.8.21.7000, Rel. Gelson Rolim Stocker, j. 23.11.2023, 6ª Câmara Cível; AI 0045047-55.2021.8.21.7000, Rel. Isabel Dias Almeida, j. 24.11.2021, 5ª Câmara Cível; AI 50005142320218217000, Rel. Isabel Dias Almeida, j. 28.04.2021, 5ª Câmara Cível; AI 02590838920198217000, Rel. Denise Oliveira Cezar, j. 30/04/2020, 6ª Câmara Cível.

11.  AI 5508621-87.2022.8.09.0051, Rel. Maria Das Graças Carneiro, j. 25.04.2023 1ª Câmara Cível; AI 5022827-32.2023.8.09.0051, Rel. Gerson Santana Cintra, j. 23.03.2023, AI 5637215-45.2021.8.09.0087, Rel. Wilson Safatle Faiad, j. 04.07.2022, 3ª Câmara Cível; AI 5397909-57.2020.8.09.0000, Rel. Mauricio Porfirio Rosa, j. 04.03.2021, 5ª Câmara Cível; AI 5110813-56.2018.8.09.0000, Rel. Mauricio Porfirio Rosa, j. 04.09.2018.

12.  AI 50143961920218240000, Rel. Soraya Nunes Lins, j. 30.03.2023, 5ª Câmara de Direito Comercial; AI 4023087-78.2017.8.24.0000, Rel. Andre Alexandre Happke, j. 30.05.2023, 2ª Câmara de Direito Comercial; AI 4005539-35.2020.8.24.0000, Rel. Gilberto Gomes de Oliveira, j. 24.09.2020, 3ª Câmara de Direito Comercial; AI 4018228-53.2016.8.24.0000, Rel. Dinart Francisco Machado, j. 07.04.2022; 3ª Câmara de Direito Comercial; AI 4023555-71.2019.8.24.0000, Rel. Jânio Machado, j. 24.10.2019, 5ª Câmara de Direito Comercial.
 

Autor(a)
Ananda Vicentini
Informações do autor
Advogada integrante do escritório RGSH Advogados, formada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e pós-graduanda em Falências e Recuperações Judiciais pela PUC-PR. Integrante de grupos de prática da área de reestruturação, como Insol Future Leaders e NextGen (TMA).
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